Solenidade de São João de Deus

Carta Circular do Superior Geral

 

SÃO JOÃO DE DEUS: A MISERICÓRDIA TUDO PODE!

Para todos os Irmãos e Colaboradores, membros da Família Hospitaleira de S. João de Deus

No dia oito de março celebramos a Solenidade de S. João de Deus, nosso padroeiro e fundador. Por esta ocasião, envio-vos as minhas felicitações e os meus votos para que vivamos este dia com muita alegria. Este ano estamos a celebrar o Ano Santo Jubilar da Misericórdia, convocado pelo Papa Francisco. Creio que é uma boa ocasião para fixarmos o nosso olhar em João de Deus e para refletirmos, embora muito brevemente, sobre a experiência da misericórdia de Deus que ele viveu e que deve ser uma fonte de inspiração para nós.

Gostaria de começar por me referir ao sermão de São João de Ávila, proferido a 20 de janeiro, em Granada, no dia da festa dos Santos Sebastião e Fabiano. Sempre me chamou a atenção: que palavras foram essas que conseguiram transformar completamente Juan Ciudad, e como terão sido pronunciadas pelo Mestre Ávila? Assim começou o seu sermão, comentando o capítulo sexto do evangelho de S. Lucas, que fala das bem-aventuranças: “Se o Senhor não tivesse descido do monte à planície, que seria de nós? Teríamos permanecido nas nossas enfermidades. Se o Senhor não se tivesse despido das vestes da sua grandeza, ocultando-as, e não se tivesse cingido com a toalha da nossa humanidade, ficariam por lavar as pessoas, cheias das suas misérias e sujidades..." (Sala Balust, L., Obras Completas, Sermão 74).

Essas palavras fizeram enlouquecer João de Deus, que acabaria por ser internado no hospital, no setor reservado aos “loucos" – um ouco por amor, como sabemos. Essas palavras eram a Palavra de Deus, penetrando como uma faca afiada até ao fundo do coração daquele livreiro que fora ouvir um famoso pregador e se encontrou com Deus, que lá esperava por ele. As reações foram excêntricas, mas, com a ajuda de Ávila, ele encontrou a paz e descobriu quanto Deus o amava, para além da sua pobreza e miséria.

Naquele sermão e nos factos ocorridos depois, o nosso fundador descobriu e viveu o núcleo central da experiência de Deus e da vida cristã: a misericórdia de Deus, que o preenche plenamente, cura e salva: de facto, a misericórdia é a característica que melhor exprime a grandeza de Deus. Provocou a conversão e a mudança em quem, desde há algum tempo, queria servir o Senhor, mas ainda não tinha encontrado a maneira de o fazer. Agora, sim, o próprio Deus lhe mostrava o caminho. A misericórdia pode tudo!

Conhecemos a dinâmica do amor de Deus, da misericórdia, da hospitalidade. Nasce de Deus e, quando se descobre, procura-se e aspira-se a mais, porque ela dá plenitude. Mas ela passa por se encarnar nos outros, que são os nossos irmãos. Aconteceu assim com S. João de Deus: o seu encontro com o Deus da misericórdia transformou-o de tal forma que já não podia deixar de se dedicar completamente às pessoas doentes, pobres e necessitadas para lhes mostrar o amor misericordioso de Deus, que ele tinha recebido. Toda esta experiência ele viveu-a e manifestou-a através da hospitalidade evangélica, uma das expressões que melhor encarnam a misericórdia de Deus: o carisma que o Espírito Santo lhe deu e do qual nós somos os seus depositários.

A partir de então, João de Deus desenvolveu e viveu com grande profundidade esta experiência que começou enquanto escutava o Mestre Ávila. Foi nessa altura que Deus o vergou e moldou. A partir daí, ele respondeu e a sua vida mudou. Temos muitos exemplos, palavras e factos que nos demonstram essa mudança. Recordo um dos seus mais conhecidos escritos sobre a misericórdia de Deus:Se considerássemos como é grande a misericórdia de Deus, nunca deixaríamos de fazer o bem enquanto pudéssemos, pois, se nós dermos por amor aos pobres o que Ele mesmo nos dá, Ele nos promete cem por um na Bem-aventurança. Oh, abençoado lucro e usura! Quem não dará o que tem a este bendito mercador, pois faz connosco tão vantajoso negócio e nos suplica de braços abertos que nos convertamos, choremos os nossos pecados e sejamos caridosos, primeiro com as nossas almas e depois com o próximo? Na verdade, assim como a água apaga o fogo, assim a caridade redime o pecado” (1DS 13).

É simplesmente genial, só possível para quem escutou o chamamento de Deus e imediatamente se pôs ao caminho, superando todos os obstáculos e adversidades, para praticar com as pessoas pobres e frágeis a misericórdia tornada hospitalidade que ele próprio tinha experimentado e na qual se tinha deleitado. Ele ensina-nos que a misericórdia tornada hospitalidade e caridade tudo pode, mesmo sendo pecadores, do mesmo modo que a água apaga o fogo.

Neste Ano Jubilar da Misericórdia, a experiência do nosso fundador é também um modelo de misericórdia para a nossa Família Hospitaleira. Convido-vos a reler a sua biografia e as suas cartas nesta perspetiva, para que ele nos ajude a crescer na experiência da misericórdia do amor de Deus e no compromisso de sermos misericordiosos com os nossos irmãos mais vulneráveis e de praticarmos a hospitalidade com aqueles que batem à porta da nossa casa e dos nossos corações.

Como fez S. João de Deus, neste Ano Jubilar da Misericórdia, todos – a nível pessoal, comunitário e institucional, nas Províncias e nas Casas – somos convidados a promover gestos de misericórdia e hospitalidade com as pessoas carenciadas que vivem perto de nós, que têm rostos concretos, que conhecemos bem. Infelizmente, existem muitas necessidades, entre as quais se destacam as dos refugiados e dos excluídos, que procuram paz e uma casa para viver.

Como faria o nosso fundador, mesmo de forma simples, abramos-lhes a porta do coração, sejamos misericordioso e pratiquemos para com eles a hospitalidade.

Como sempre, nesta data, gostaria de comunicar a toda a Ordem o resultado da Campanha de 2015, que se destinava a apoiar os nossos centros na Serra Leoa e na Libéria, onde alastrou a epidemia de ébola, e que foi a continuação da que já tinha sido lançada em meados de 2014, em favor da mesma causa. A verba angariada desde 2014 atingiu o montante de 3.096.102,48 euros, fruto da generosidade e solidariedade de toda a Ordem e de outras instituições que nos ajudaram: exprimo aqui a todos, de novo, o meu mais sincero agradecimento.

Ao mesmo tempo, informo que o resultado da campanha para o presente ano de 2016 se destina à construção de um centro de formação em Madang (Papua-Nova Guiné). Mais uma vez, obrigado pela vossa generosidade e peço-vos que apoiemos esta causa, a fim de reforçarmos a presença da nossa Ordem neste país.  

Feliz festa da Família Hospitaleira de S. João de Deus: oxalá que a sua vida e a sua experiência da misericórdia de Deus continue a ser uma fonte de inspiração para todos nós, para que possamos continuar a manifestar por palavras, e especialmente com o nosso testemunho de vida, que a misericórdia tudo pode alcançar!

Unidos no Senhor e em S. João de Deus, recebei um abraço fraterno.

 

 

Ir. Jesús Etayo

Superior Geral 

 

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